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O aumento do custo dos insumos da construção civil e o reequilíbrio econômico-financeiro de contrato

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A partir do segundo semestre do ano de 2020, especificamente após o mês de setembro, o preço de grande parte dos insumos da construção sofreu elevação significativa, ensejando o rompimento da equação econômico-financeira estabelecida no momento da apresentação da proposta de preços na licitação pública.

Os motivos para o aumento imprevisível são diversos, decorrentes da pandemia do coronavírus (COVID-19), que promoveu o reaquecimento do mercado e a falta de matéria prima disponível. A escalada dos custos dos materiais de construção foi noticiada nos mais diversos veículos de imprensa, caracterizando-se como excessiva, extraordinária e de proporção incerta.

Dada a dimensão da rede contratual impactada e a relevância dos insumos na execução das mais diversas obras de engenharia civil no país, o aumento desenfreado do preço desses insumos representou um enorme risco de prejuízos sistêmicos à economia do setor.

O aludido aumento pode ser demonstrado pelo estudo elaborado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), que fez apanhado de notícias publicadas em âmbito nacional sobre o aumento do custo dos materiais. A CBIC ouviu empresas em 25 estados das cinco regiões brasileiras, o que resultou em pesquisa de 462 empresas entre os dias 16 e 21 de julho.

Como fruto desse estudo, a CBIC enviou carta à Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade vinculada ao Ministério da Economia, a fim de notificar que os aumentos foram claramente ocasionados pela falta de oferta adequada dos principais produtos necessários à execução de obras públicas e privadas.

O Índice Nacional de Custos da Construção (INCC/FGV), por sua vez, traduziu o aumento imprevisível e extraordinário do custo dos insumos da construção civil. Ao interpretar o INCC, percebe-se que o custo com materiais apresentou elevação de 3,08% em setembro de 2020, a maior desde dezembro de 2002 (3,63%), ou seja, dos últimos 18 anos.

Em estudos mais recentes, realizados em março de 2021, é possível perceber que em 12 (doze) meses o custo dos materiais aumentou 25,05%, após análise acumulada do INCC, calculado e divulgado pela Fundação Getúlio Vargas e exemplificado pelo gráfico abaixo:

Por fim, mas não menos importante, o Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (SINAPI), desde setembro/2020, indica que o custo dos insumos apresentou altas superiores a 1% ao mês. Entre setembro de 2020 e abril de 2021 o SINAPI registrou as suas maiores variações desde 2013, quando teve início o seu cálculo com a desoneração da mão de obra.

No primeiro trimestre de 2021, o índice aumentou 4,84%, maior alta registrada desde 2013, e nos últimos 12 meses (abril/2020-março/2021) 14,46%.

Isso tudo mostra a instabilidade vivenciada por órgãos públicos e pelos construtores na execução de obras públicas, que enfrentaram a abrupta e constante defasagem dos preços dos custos diretos estabelecidos inicialmente no contrato.

A alteração imprevisível e significativa dos custos dos insumos atrelados à construção civil é um dos fatores que podem desequilibrar a equação econômico-financeira do contrato de execução de obras públicas.

Essa hipótese faz parte da álea econômica, por ser imprevisível e decorrer de fato superveniente que altera fundamentalmente as condições de execução do contrato.

A modificação de mercado que pode gerar onerosidade excessiva para o particular que assumiu o risco de executar a obra a partir de orçamento base fixado em edital de licitação, com planilha de preços que pode se referenciar tanto em orçamentos feitos pelo órgão licitante quanto por outros índices, sendo comum a utilização do SINAPI (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices).

Caso não haja revisão de preços, essa situação poderá causar o enriquecimento indevido da Administração Pública, na hipótese de se exigir a execução de contrato com preços de insumos defasados.

A Constituição Federal garante aos particulares que contratam com a Administração o direito à manutenção das “condições efetivas da proposta” apresentada durante o processo licitatório (artigo 37, inciso XXI), de modo que a Administração tem o dever, constitucional e legal, de respeitar essas condições.

Isso significa que a equação econômico-financeira do contrato administrativo deve ser compreendida de forma ampla, de forma que o reequilíbrio deve neutralizar a integralidade do prejuízo suportado pelos contratados na incidência de evento que desequilibre a relação contratual.

Ou seja, deve-se levar em conta, de um lado, o conjunto dos encargos previstos no edital e, de outro, as vantagens que o particular previu em sua proposta. Não é por outro motivo, afinal, que a norma constitucional de intangibilidade (art. 37, inc. XXI) impõe o respeito às condições efetivas da proposta oferecida pelo particular.

Na esteira da matriz constitucional, a Lei 8.666/1993 tratou do tema de forma abrangente. Garantiu o equilíbrio econômico-financeiro para os casos de prorrogação de prazos contratuais (art. 57, § 1º) e modificação unilateral do contrato pela Administração (art. 58, §§ 1º e 2º).

O célebre art. 65 regulou a alteração dos contratos administrativos e estabeleceu a tutela ao equilíbrio econômico-financeiro. No inciso II, alínea “d”, previu a hipótese de sobrevivência de fatos imprevisíveis, ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.

Apesar de a Lei n. 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações) ter promovido mudanças importantes quanto ao conteúdo do reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos, dando mais objetividade e especificidade ao instituto através do instrumento da matriz de riscos, acabou por trazer conteúdo normativo geral que se assemelha muito ao que a Lei 8.666/1993 dispôs até o momento, principalmente quando analisado o art. 124, inciso II, alínea “d” da Lei que, basicamente, é uma cópia do que fora tratado pela Lei anterior:

Art. 124. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: (…) II – por acordo entre as partes: (…) d) para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato.

Nota-se que a diferença da previsão supracitada ao que consta no artigo 65, inciso II, alínea “d” da Lei 8.666/1993 está no fato de que a Nova Lei previu a observância da repartição objetiva do risco estabelecida no contrato. Não se está a tratar especificamente da matriz de riscos, mas de responsabilidades estabelecidas na minuta do contrato que, a depender das premissas fáticas de imprevisibilidade, poderão impedir a concessão do reequilíbrio econômico-financeiro do contrato ao particular.

O art. 130 da Nova Lei de Licitações e Contratos, por sua vez, repete o que consta no §6º do art. 65 da Lei 8.666/1993: “caso haja alteração unilateral do contrato que aumente ou diminua os encargos do contratado, a Administração deverá restabelecer, no mesmo termo aditivo, o equilíbrio econômico-financeiro inicial.”

Por isso, opta-se por não aprofundar o assunto, pois os fundamentos já expostos anteriormente, que fundamentam a manutenção do equilíbrio da equação inicial do contrato, se aplicam também ao dispositivo em comento.

No entanto, quais são os critérios exigidos pelos órgãos de controle para que se demonstre objetivamente que a equação econômico-financeira teve o seu equilíbrio rompido?

Qual a metodologia de cálculo utilizada para se restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato?

Essas questões de debate serão tratadas no artigo que será publicado na semana que vem!

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