A Restrição da Competitividade Como Consequência da Indevida Aglutinação de Itens em Licitações
Nas licitações, o princípio da competitividade tem papel fundamental na escolha da proposta mais vantajosa pela Administração Pública, especialmente sob o ponto de vista de satisfação do interesse público, pois sobre tal interesse paira a expectativa de uma contratação econômica, na qual o contratado seja capaz de executar o objeto com eficiência.
Nessa tarefa de tornar a licitação competitiva, a correta definição do objeto é essencial, conforme disposto no art. 3º da Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002 (Lei do Pregão): Art. 3º A fase preparatória do pregão observará o seguinte: II – a definição do objeto deverá ser precisa, suficiente e clara, vedadas especificações que, por excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, limitem a competição (…)”
Portanto, a observância do princípio da competividade significa que a Administração Pública deve estabelecer critérios de contratação que fomentem o maior número de interessados no certame, com o fito de atrair uma diversidade de propostas, sem deixar de lado a especialidade necessária para a melhor execução do objeto licitado.
A concentração e o parcelamento do objeto licitado
De forma a orientar o administrador público sobre a definição do objeto e a forma de contratação, o art. 23, § 1º da Lei nº 8.666/93 (Lei Geral de Licitações), aplicado subsidiariamente à Lei do Pregão, estabelece: § 1º As obras, serviços e compras efetuadas pela Administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala. Assim, a depender do caso concreto, a contratação pode ser realizada de forma concentrada ou parcelada, conforme didaticamente busca-se sintetizar:
- Preço global, cuja proposta abrangerá todas as especificações do objeto, ao passo que apenas um licitante vencerá o certame;
- Preço por item, sendo que os licitantes direcionarão propostas individuais para cada item que engloba o objeto do certame, de forma que a Administração poderá contratar várias licitantes diferentes para cada item, realizando adjudicações distintas, ainda que na mesma licitação, e;
- Preço por lote ou grupo, oportunidade em que as propostas serão mensuradas e direcionadas para um conjunto de itens, mas não a totalidade do objeto, situação em que a Administração também poderá contratar vários licitantes diferentes, com adjudicações distintas.
Para o Tribunal de Contas da União (TCU), a regra de contratação é a parcelada, conforme entendimento firmado na Súmula 247: É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade.
Inclusive, no Acórdão nº 2.407/2006, o TCU decidiu ser injustificável a licitação adjudicada pelo preço global cujo objeto era a compra de mobiliária e de divisórias, fundamentando tal entendimento na ideia de que se a licitação fosse por item, empresas especializadas em divisórias também poderiam participar, de forma que a adjudicação parcelada de mobílias e divisórias acarretaria maior economia para a Administração.
Contudo, existem exceções à regra estabelecida pelo TCU, entre as quais podem ser citadas a complexidade de determinado objeto, cujo parcelamento ocasionaria a não compatibilidade dos diversos itens fornecidos por licitantes distintos, com a consequente inutilidade deles por não “se encaixarem” um ao outro, além da difícil missão de se realizar a gestão de múltiplos contratos relativos a um único objeto.
A Aglutinação Indevida de Itens e a restrição da Competitividade
Uma prática que restringe a competitividade do certame é a injustificada aglutinação de itens incompatíveis ou divisíveis em um único lote ou objeto. Em licitação de serviços, por exemplo, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná -através do acórdão nº 931/20/Tribunal Pleno – entendeu que “apenas em circunstâncias específicas, de caráter técnico ou econômico, atinentes às peculiaridades do licitante, é possível autorizar a aglutinação dos serviços a serem licitados em lote único, desde que devida e expressamente motivado pelo gestor, nos termos do art. 23, §1º, da Lei nº 8.666/93”, inclusive com a obrigatoriedade de elaboração de planilha detalhada com a indicação da composição dos custos unitários relacionados a cada obra ou serviço licitado.
Outro exemplo foi a recomendação 001/2021 dada pelo Ministério Público de Contas do Estado do Espírito Santo à prefeitura de Vitória/ES, no sentido de que anulasse os editais dos pregões eletrônicos nº 50/2021 e nº 51/2021, que tinham por objetivo a contratação de empresa para prestação de serviços de coleta, transporte, tratamento e destinação de resíduos dos serviços de saúde e de resíduos sólidos do município. No entender do referido órgão, tais serviços foram aglutinados indevidamente, pois segundo a Portaria Conjunta 02/2012 do TCE-ES e do MPES, é recomendado “desvincular a destinação final dos resíduos sólidos, considerado item de serviço de baixa concorrência, dos demais itens de serviços que podem compor a limpeza urbana”.
Em termos gerais, a aglutinação indevida direciona a licitação para licitantes com atuação genérica, em prejuízo aos licitantes com atuação especializada em apenas um item que compõe o conjunto licitado, restringindo a competitividade e a diversidade de propostas.
Por isso, antes de publicar editais com itens aglutinados, o ente contratante deve avaliar as circunstâncias específicas, de caráter técnico e econômico, sob risco de restringir a competitividade do certame e ter o edital impugnado, suspenso e até anulado.
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